Em artigo lúcido, Adir Machado reflete sobre o quão difícil, mas absolutamente necessário, é as mulheres não cederem um milímetro nos seus direitos, a exemplo de Marina Silva

Já publicado pela coluna Plenário, de Diógenes Brayner (leia AQUI), e pelo Blog do Cláudio Nunes (leia AQUI), esse artigo do advogado e amigo Adir Machado é fundamental para quem acredita que uma sociedade mais justa e igualitária pode existir para além da retórica. E, nessa sociedade, não há espaço para ataques vis como os que foram desferidos contra a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, em sessão duma comissão do Senado. Por tudo isso e muito mais, VALE LEITURA!

Quando o Machismo Substitui o Debate: Em Defesa de Marina Silva e da Democracia

Adir Machado Bandeira*

Há momentos na história política em que não é mais possível o silêncio. Não se trata de escolher lados partidários, ideológicos ou de governo. Trata-se de algo muito mais profundo, mais grave e mais urgente: o dever de defender a dignidade, o respeito e os pilares básicos da democracia.

O que assistimos no Senado Federal, com as agressões direcionadas à ministra Marina Silva, não é apenas uma afronta a ela enquanto integrante do governo. É uma afronta a todas as mulheres que ousam ocupar espaços de poder, que se recusam a abaixar a cabeça e que, mesmo enfrentando uma estrutura historicamente patriarcal, continuam firmes, altivas e preparadas para exercer com excelência suas funções públicas.

Não é novidade que, quando uma mulher ocupa uma cadeira onde historicamente só se sentaram homens, o desconforto de muitos aflora. A crítica técnica, legítima e saudável para a democracia, cede lugar a ataques desqualificadores, que não se voltam ao conteúdo, mas ao gênero, à existência e à ousadia de ser mulher em espaços de decisão.

O que fizeram com Marina não é um episódio isolado. É expressão de uma misoginia estrutural que perpassa os partidos, os poderes e as instituições. Marina Silva, mulher, negra, de origem humilde, ambientalista, vencedora em um país que não costuma perdoar quem ousa vencer sendo quem ela é, tornou-se alvo não por seus argumentos, mas por ser quem é.

O episódio de repercussão nacional envolvendo pessoa pública de projeção internacional serve inclusive para não minimizarmos os ataques são feitos feitos em todo canto deste país, a exemplo dos ataques e perseguições orquestrados às Deputadas Kitty Lima e Linda Brasil, Deputadas em Sergipe, quando, ao invés de debaterem suas propostas e atuações, fazendo a crítica política legítima, parte da sociedade, muito bem enraizada no poder, opta por atacá-las pessoalmente, desqualificá-las e constrangê-las.

A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todo lugar.”

Inspirado nesta parte da famosa “Carta da Prisão de Birmingham” escrita por Martin Luther King Jr. em 16 de abril de 1963, enquanto estava preso por participar de protestos pacíficos contra a segregação racial, voltarei em novo artigo a tratar do que ocorre em Sergipe.

Por ora, relembro que o contexto da frase de King é extremamente poderoso: ele alertava que não podemos considerar um problema como local, isolado ou irrelevante, porque onde quer que haja injustiça, ela ameaça todo o tecido da sociedade e da humanidade. O silêncio ou a omissão diante da injustiça em qualquer lugar equivale a ser cúmplice dela em toda parte.

O recado que tentam dar é claro: “Mulheres, não se atrevam. Esse espaço não é de vocês.” Mas, como bem ensinou a história, quanto mais tentam empurrar as mulheres para fora da arena pública, mais elas se fortalecem. E não estão sós. Homens e mulheres que compreendem a importância de uma sociedade justa e igualitária estão atentos e dispostos a não tolerar esse tipo de violência disfarçada de debate.

Não se trata de concordar com Marina em tudo. Trata-se de compreender que o contraditório precisa ser exercido dentro dos limites do respeito, da civilidade e da igualdade. Discordância não pode ser desculpa para agressão. Divergência não autoriza a violência simbólica, verbal e institucional.

É preciso dizer, com todas as letras: o que ocorreu no Senado não envergonha Marina. Envergonha quem praticou. Envergonha o país. Envergonha a democracia.

Da mesma forma que defendemos as mulheres em Sergipe, defendemos agora Marina Silva no cenário nacional. Porque a luta não é apenas das mulheres. É de todos aqueles que acreditam em uma sociedade onde o mérito, o preparo e a dignidade estejam acima do preconceito, do machismo e do ódio.

Que a cena lamentável que assistimos sirva de alerta. O Brasil do futuro não comporta mais esse tipo de comportamento. E quem insistir em agir assim estará, inevitavelmente, condenado à irrelevância moral, histórica e política.

Advogado”.

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2 Comentários

  • Ribeiro Filho

    29 de maio de 2025 - 13:16

    O titulo desse artigo: “Quando o Machismo Substitui o Debate: Em Defesa de Marina Silva e da Democracia” do eminente advogado Adir Machado Bandeira, poderia ser substituído sem nenhuma perda por este: “Quando o vitimismo substituído o debate técnico, e serve oportunamente como estratégia de fuga ao debate.”

    Existe um ditado aqui da região, que minha aidosa mãe sempre repetia ” Se não pode com o pote, não pegue na rodia (rodilha), ou seja se você não tem preparo ou argumentos substanciais para enfrentar um debate desafiador, fuja desse confronto que já anuncia uma derrota, evite ou fuja da forma menos vexaminosa.

    É óbvio que o convite para a Ministra Marina Silva comparecer à Comissão de Constituição e Justiça não foi endereçado a mulher, negra, nascida de família pobre, que estudou com dificuldades. Subjetivamente todos esses dados estavam incluídos na construção da personalidade de Marina Silva. Como também estava embutido subjetivamente, que a Ministra tinha uma personalidade forte e agressiva, que costuma apontar o dedo em riste na cara dos debatedores e falar aos gritos para tentar desestabilizar o psicológico dos seus oponentes.
    Porém esse lado forte, destemido e audaz não serviria para aquele momento, em que a Ministra estava em desvantagem na sustentação dos seus fracos argumentos. Então qual seria a melhor saída? Tornar-se vítima do machismo patriarcal histórico, que forjou a base da nossa frágil sociedade brasileira. Já se prenunciava que a Ministra Marina Silva não sustentaria aquele debate de forma equilibrada até o final. Então, a ministra se apequenou e deu lugar a mulher negra, pobre e indefesa.

    Foi uma saída gloriosa para quem estava prestes a ficar sem respostas para as perguntas que ainda viriam, sobre o seu péssimo Ministério do Meio Ambiente, com tantas queimadas e desmatamentos, e o crescente número de mortes dos indígenas yanomamis, de fome e subnutrição.

    Assim, Marina silva saiu de fininho como vítima e ainda ganhou a defesa de um advogado em Sergipe, para enaltecer sua brilhante saída como vítima e defender seus atributos de mulher frágil, diante dessa horrenda sociedade machista.

    * Ribeiro Filho Cientista Político e Social
    Graduação em Comunicação Social
    Mestre em Sociologia pela UFS
    Doutorando pelo PUC-SP

  • ‘Eu já Sabia’: Elber Batalha, na Câmara de Aracaju, defende bem Marina Silva dos ataques que ela sofreu. Top! Mas faltou um detalhezinho que AnderSonsBlog explica - Jornalismo | Andersonsblog

    29 de maio de 2025 - 17:27

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