VALE LEITURA – Rian Santos diz o que AnderSonsBlog até tenta, mas falha miseravelmente. Em resumo: sem mundo, do que se arvorar? Sem vida, do que se orgulhar? E sem nós, pra nada teremos servido?

O mundo apocalíptico é fudidamente real! E olha que a gente tá aqui, agora, num compartilho esquisito danado da peste destes terríveis tempos, ora pois!

Mas se assim o é e se não estamos fazendo muito sobre o que aí está, que ao menos tenhamos um tempinho pra ler aquilo que, sem cerimônias ou licença pra “entrar na sala”, são leituras necessárias pra gente, finalmente, minimamente tentar se entender.

E é isso o que Rian Santos nos propõe a partir de um texto dele originalmente publicado no Jornal do Dia (leia AQUI).

AnderSonsBlog não vai antecipar mais do que o necessário, beleza? Mas é impossível não avisar que o texto de Rian corta afiadamente, posto que é cirúrgico.

Mas, e ao mesmo tempo, também ajuda a remendar com precisão os talhos que a crueza da vida vigente impõe ao lombo de quem decide por se arriscar a duvidar, a questionar e de novo questionar e, por fim, quem sabe até entender, mas jamais aceitar o que aí está. Simples assim! Necessário assim! E vamos à leitura do que Rian, ainda bem, nos joga na cara!

Fake plastic trees

 Rian Santos*

Ontem, atirei dez centavos a um mendigo estirado numa esquina do Centro. Ele tinha as mãos descobertas de pedinte profissional. Eu carregava uma moeda pequena, sem valor, nem propósito, no fundo do bolso. Na brevidade de gestos tão pequenos, encontramo-nos, os dois, fadados ao mesmo destino de plástico, sem saber nada um do outro.

Um estudo publicado pela revista Nature Geoscience estima que os oceanos recebem 500 mil toneladas de plástico todos os anos, plástico em grande parte proveniente da indústria pesqueira.

Dos rios, deriva lixeira ainda maior: seriam oito milhões de toneladas anuais. Os pesquisadores lembram que a matéria das garrafas pet não evapora, não se decompõe. E, assim, tende a envenenar toda a gente.

Hoje, há plástico na nossa corrente sanguínea, nos nossos pulmões, nos corações aflitos dos amantes desesperados, uma involução que não tem nada de natural.

Primeiro, o artesanato foi vencido pela produção em série, depois superada pela automação. Agora, mesmo os profissionais criativos, nós que sonhamos para ganhar o pão de cada dia, estamos em vias de ser mandados para o olho da rua, substituídos pelos algoritmos, por uma suposta inteligência artificial

Só eu posso chorar quando estou triste, protestou Gilberto Gil, muito antes de o cérebro eletrônico ameaçar o meio de vida dos poetas, com a lógica fria que as bonecas infláveis jamais ousaram impor às dificuldades das mulheres de vida fácil. Cantou para as paredes, no entanto, pouco importa se alegre ou feliz.

Aparentemente, todas as fórmulas empregadas num verso, na caligrafia do pintor, nas pausas, inflexões e alturas apontadas numa pauta musical, atendem a uma razão matemática.

Por isso, aproxima-se o dia quando jornalistas, putas e mendigos disputarão o mesmo ponto, a mesma calçada, a mesma esquina. Itabira será, então, só um retrato na parede. Mas como dói!

*riansantos@jornaldodiase.com.br“.

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